Em terapia, o tema da sombra é inevitável. Não há como fugir-lhe, porque não há quem não a tenha. Somos também sombra, sim. (E, para mim, isso é lindo, porque me fala da humanidade que a todos toca, a todos une.)

O assunto da sombra é delicado, como se envolto em papel de seda. Ainda que, por vezes, ler sobre o assunto nas redes sociais possa levar a pensar que abordar a sombra em contexto terapêutico é algo simples, na verdade não é.
Não pode ser.
Ainda bem que não é.

Se pensarmos que por sombras se entendem as partes de nós de que nos envergonhamos, aquelas que nos levam a fazer de tudo para que ninguém suspeite da sua existência, e que escondemos até de nós próprios, facilmente percebemos a sensibilidade do tema.

Estas partes que aprendemos a ocultar desde a infância (em grande medida, porque nos fomos apercebendo que não tinham muito sucesso entre os adultos que cuidavam de nós) estão, em regra, protegidas por fortes armaduras e muralhas de pedra. Construídas por nós, claro, ao longo do tempo. Portanto, trata-se de um assunto da máxima delicadeza, protegido por camadas duras e rígidas, destinadas a dificultar o acesso a quem quer que ouse aproximar-se e inteirar-se de tudo o que somos.

As sombras podem ser facetas simples e inofensivas, ou nem tanto. Algumas são enormes e estão tão escondidas que assumem tamanhos fantasmagóricos em nós. Outras nem suspeitamos que estão cá (mas pode acontecer que estejam à vista de toda a gente).

Há sempre camadas e camadas de sombra para ver. Nunca vemos tudo (sobretudo, porque nem sempre queremos ver tudo, mesmo quando nos abrimos ao processo. É mesmo assim). Como tal, vamos vendo. Como na vida.

Vem isto tudo a propósito de umas anotações que fiz, há quase dez anos, sobre a obra “Além da Luz e da Sombra”, da autoria de Jean-Yves Leloup, e que ontem encontrei por aqui numas pesquisas.


“A sombra é o que dá relevo à luz”, escreve ele, acrescentando que “no coração da sombra existe a luz. E no coração da luz existe a sombra”.

Ver e acolher as nossas sombras é, pois, o caminho para permitir a nossa luz. E é esse o caminho que inevitavelmente (também) se percorre na Terapia Transpessoal.